Definir o Ser português...
...não é fácil!
Tenho estudado bastante história, nacional e internacional, tenho viajado bastante e já fui emigrante…E soube-me muito bem voltar a Portugal, e sentir-me em casa. Tinha saudades.
Mas à parte desse “sentir” (que os de outras nacionalidades também sentem) continuo a não saber o que é ser português, nem o que nos define enquanto povo, nação ou cultura.
Se a nacionalidade é só uma bandeira, um hino e o que está escrito num B.I….que se f…Haverá algo mais?
Dizem que somos muito homogéneos: um território, um povo, uma língua, cultura... específicos...Será?
Em termos de nacionalidade sei que somos dos países da Europa com menos estrangeiros (4%, contra 12% da Alemanha), mas além desses 4%, ainda há muitos mais. Há os mistos, e mestiços, a herança colonial, as emigrações, etc.. Quem é mais tuga, um filho de ucraniano, cristão ortodoxo, loiro de olhos azuis, que em casa fala ucraniano e na rua fala um português perfeito, ou um filho de tuga, filho de emigras em NewJersey, que em casa fala mistura de português com inglês? Ou o filho de um brasileiro, nascido e criado em Portugal, que fala um português tuguês misturado com nordestino? Ou um filho de Cabo-verdiano, 100% português seja nascido cá ou lá. Ou tuga de Viana do Castelo que é muito mais próximo de um espanhol da Galiza, que de um Português do Algarve? Ou o tuga emigrado na França e na Alemanha. Dizem que são milhões de tugas espalhados pelo mundo. Dizem que havia 1 milhão só na zona de Paris, que seria a certa altura a maior cidade portuguesa! Duvido, mas mesmo assim é significativo. Cerca de 10% da população…E tantas vezes os emigrantes parecem mais portugueses, e mais orgulhosos de o serem, que os residentes em Portugal...
Misturando nacionalidade com territorialidade devemos lembrar-nos que, durante alguns séculos, supostamente, o território português não era o actual. Incluía o Brasil (até o Rei português fugir para lá e excluir-se, a ele, á sua corte e ao Brasil, de Portugal..) e, ainda depois, incluía possessões costeiras pela África e Ásia fora… Ainda há 40 anos portugueses morriam para tentar reter esses territórios ultramarinos! E durante uns muitos bons anos, o Reino de Portugal e o das Espanhas estiveram unidos…Mesmo o clima- semi atlântico, semi mediterrâneo - não nos dá nenhuma característica muito própria, desde logo em relação a nuestros hermanos! Ou seja, mesmo em termos de território x nacionalidade não somos muito fáceis de definir. Não admira que em boa parte do mundo pensem que somos uma parte de Espanha!
Etnicamente, o tuga é mistura genética milenar, mesmo anterior à expansão ultramarina. Já no tempo dos romanos e dos que vinham do sul, do que hoje chamamos norte de África, que a certa altura se tornaram muçulmanos, já éramos mistura genética. Depois, com os que vieram do norte da Europa, a misturada aumentou. Entretanto, politicamente surgiu um reino de “Portugal”. Depois fomos para África, Ásia e Américas casar e procriar, em termos étnicos, económicos e culturais. Mais misturada. Hoje, não temos quase nada que nos distinga de um espanhol, marroquino ou até italiano. Mesmo na Turquia ou em Israel, até eventualmente no Irão, a maioria de nós passamos desapercebidos. Nos EUA tanto passamos por caucasianos como por hispânicos! A minha ex esposa parecia mais inglesa ou francesa que portuguesa…
Em termos de língua sabemos que o português é pouquíssimo diferente do Espanhol, que se enquadra na enorme família de românicas, que se encaixa na enorme família indo-europeias! Há imensas similaridades entre o hindi e o português! Ou seja, o português é um derivado de uma enorme família linguística, e que incorpora influências do árabe, do persa, de línguas hindustanicas, e mais recentemente do francês e inglês. Entre outras. Mas certo, a dada altura formou-se aqui uma língua especifica de um reino, de Portugal, ligeiramente diferente do castelhano. E ao sair levamos este português para ouras paragens. E essa é a nossa maior marca na história mundial, sem dúvida, e não é pequena. Mas entretanto deu-se o regresso. Os Palops, e outros, infiltraram no português imensos aligenas, sem os quais mal reconheceríamos o vernáculo actual. Hoje temos um português a unificar-se, que se resistir é pela força do Brasil, e é por ele liderado. Na realidade já somos minoria no português. Não somos apenas minoria, somos o elo mais fraco! Também a língua não é nossa, nem nos define. E hoje até tendemos todos a ser bilingues de nascença, com o inglês a tornar-se a principal língua do mundo, língua franca, para Portugal incluído... Quando vamos a wikipédia, a qual vamos primeiro: a escrita em inglês(es), ou a escrita em portugues(es). E, consoante a língua, a que artigos damos mais credibilidade? A maioria dos portugueses dá mais credibilidade ao escrito em inglês, que considera quase a versão "oficial", pensando nisso como "mais verdade". A portuguesa é desconsiderada com a desculpa dos "brasileirismos"!
E em termos culturais? Culturais além da língua...O que é que nós temos que nos distinga de outros povos?
Trabalhamos, uns mais outros menos, com uma produtividade parecida à Espanhola (entre a Alemanha e Marrocos) a maioria a pensar no fim do trabalho, para sair á noite e aos fins de semana, bebermos uns vodkas, tequilhas e whiskies, com coca-cola, e cerveja, consome-se estupefacientes com força, fuma-se, engata-se, conversa-se…Sonha-se com amores românticos, e não tão românticos…e temos um mundo de pornografia virtual-universal inesgotável, em caso de necessidade!
Consumimos música e cinema 99% anglo-americano (e americanizada)…não tenho amigos nos ranchos populares, e temos poucos que oiçam fado…Na TV vêem-se talk shows, Bigbrothers, telenovelas brasileiras ou abrasileiradas. E séries anglo-americanas. E lê-se alguma literatura, cada vez mais anglo saxónica. O mesmo se passa com livros académicos, seja de economia, biologia ou história. Se não for publicado em inglês e aceite numa revista internacional nem os cientistas portugueses aceitam como sendo "ciência". E o mesmo com os livros de espiritualidades e auto-ajuda.Os jornais baseiam-se nas notícias fabricadas pelos media internacionais, e seus modelos. É muito mais respeitável ler o Economist do que o Jornal de negócios. E não é que as fontes e as notícias sejam muito diferentes!
Joga-se na net, nas consolas…ou o monopólio, o Catan, a seuca…
Lê-se o correio da Google ou da Microsoft, escreve-se em blogs, passa-se palavra no Facebook, engata-se online, nos chats, compra-se em centros comerciais e na internet… produtos que em 99% dos casos têm pouco ou nada de português. O sonho do tuga, como do espanhol, é conduzir um carro alemão senão mas tem $ compra antes francês ou coreano. Os tugas mais jovens contentam-se em exibir um Mac, ou um Ipad, ou, melhor ainda, um Iphone.
Vestimos moda espanhola, inglesa e italiana made in china.
Vestimos moda espanhola, inglesa e italiana made in china.
Come-se, cada vez mais, produtos estrangeiros e fast-food internacional…Não é que os pratos que não são fast food urbana e contemporânea fossem muito tugas. Na realidade, boa parte dos vegetais que enchem os nossos pratos não existiam por cá ao tempo do Afonso Henriques. Não havia especiarias, café, chá, chocolate, açúcar, boa parte dos legumes (tomate, milho, batata, etc). Até o tabaco e as outras drogas mais potentes são estrangeirismos, e relativamente recentes! E a cerveja e vinho, que são as bebidas mais antigas e internacionais da humanidade, também não eram grande coisa até há pouco tempo. Fora o vinho do Porto, aprimorado pelos ingleses, a maioria do vinho português era, até há poucas décadas, uma lavagem pouco bebível. Até o arroz e bacalhau, tão "típicos" são importações estrangeiras, e relativamente recentes!
As "nossas" maiores empresas, sobretudo as exclusivamente privadas, estão registadas e pagam impostos no estrangeiro, seja na Holanda ou em paraísos fiscais!
A nível jurídico, religioso e de ideologias e sistema político-económico não temos nada nascido e desenvolvido em Portugal…Até neo nazis “nacionalistas” cá temos! Queixamo-nos que a nossa democracia é dominada por políticos corruptos e conspiradores semi secretos, como a Opus Dei e demais grupos de pressão católicos, pela maçonaria, e lobbies gays, judaicos, sindicalistas e capitalistas, pelas mafias do crime organizado… e queixamo-nos da economia paralela, da corrupção... queixamo-nos de tudo e todos! E estamos sempre prontos a acreditar na mudança, no progresso, na salvação redentora. Até nisso somos humanos normais.
A nível jurídico, religioso e de ideologias e sistema político-económico não temos nada nascido e desenvolvido em Portugal…Até neo nazis “nacionalistas” cá temos! Queixamo-nos que a nossa democracia é dominada por políticos corruptos e conspiradores semi secretos, como a Opus Dei e demais grupos de pressão católicos, pela maçonaria, e lobbies gays, judaicos, sindicalistas e capitalistas, pelas mafias do crime organizado… e queixamo-nos da economia paralela, da corrupção... queixamo-nos de tudo e todos! E estamos sempre prontos a acreditar na mudança, no progresso, na salvação redentora. Até nisso somos humanos normais.
Somos consumistas e vivemos de crédito, como por todo lado…Adoramos viajar pelo mundo fora, emigramos. Embarcamos em ideologias orientalistas, ou de downsizing e regresso á terra…
Perdemos horas infinitas a ver e falar de futebol, esse desporto inventado por ingleses e aperfeiçoado por sul-americanos!
Podemos ser mais internacionalizados e indistintos do que isto? Além do vago “sentir”, o que há, em termos culturais, de relevante, de especificamente português?
Ganhamos nacionalidade dentro da Europa cristã, enquanto reino tributário, com a bênção de um Papa que fez pagar a autonomia a preço de ouro. Tivemos o nosso apogeu quando alguns dos nossas antepassados foram para fora, e quando de fora trouxemos riqueza em forma de terras, especiarias, sedas, prata e escravos. Isso já lá vai. Hoje não temos autonomia política, militar, económica, financeira, monetária e cultural. Somos, mais do que nunca, um Estado europeu, bem integrado, e, brevemente, após a venda do mercado que fizemos nos últimos 25 anos, seremos de novo um Estado tributário. Neste caso não para pagar uma autonomia conquistada a ferros, mas para pagar a falta de responsabilidade. E o que se vê, é que, se voltarmos a ter de viver mais para nós, e só de nós mesmo, será sinal mau sinal, para nós e para meio mundo…Para o restante meio mundo somos pouco mais que indiferentes!
Será que hoje, mais do que nunca, perante o mundo virtual quase infinito, a visão da terra como aldeia global no meio de um Cosmos imenso, no meio desta globalização dos grandes blocos, tão pequeninos que somos, com uma economia tão aberta e endividada ao estrangeiro, podemos achar que há um “Portugal para os portugueses”? Ou sequer um "Portugal português"?
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